Cliente Rei

Para entender o cliente de hoje, é preciso saber quais foram os fatores que o fizeram chegar até aqui, do jeito que ele é. Mais do que uma simples mudança do dia para a noite, as transformações no marketing – conhecidas como "Eras do Marketing" – e as evoluções na humanidade, – cognitiva, industrial e tecnológica - juntas, foram responsáveis pelo nascimento do cliente rei.

Antes de partirmos para essa linha do tempo, no entanto, é importante estabelecermos as diferenças básicas entre cliente e consumidor. Por definição, o cliente é um comprador frequente de um vendedor ou estabelecimento. Ele permanece cliente, tem um hábito, estabelece conexões. O consumidor, por sua vez, não cria esses laços. Pode-se dizer que ele “está cliente” em algumas situações, mas nunca que ele é cliente.

Em 1453, logo após o fim da Idade Média, com a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos, surge o que viria a ser o maior bazar fechado do mundo: O Grand Bazaar. Talvez o primeiro centro comercial onde se “brigavam” por consumidores.

Em 1760, a Inglaterra começou a passar por transformações econômico-sociais e a partir disso, o modo de produção industrial se espalhou pelo mundo e o embrião do que viria a ser o cliente de hoje, surgiu.

Com o advento da máquina a vapor, o crescimento das fábricas, a substituição da energia humana por energia motriz e a exploração da classe operária, as mercadorias ficaram mais baratas e o consumo cresceu. Entre as milhões de consequências da Revolução Industrial, está o que é conhecido no marketing como “Era do Produto".

A produção veloz e em massa acontecia independentemente do cliente por uma razão simples: a procura era maior que a oferta. Assim, as empresas se viam em uma situação bastante sossegada, sem ter de dar muita atenção ao cliente.

Essa relação começou a mudar perto de 1925, quando se iniciou a chamada “Era das Vendas”. As empresas começaram a focar seus esforços em encontrar compradores.

As coisas só começaram a mudar perto de 1950 e foram até os anos 90, com a chamada terceira fase da Revolução Industrial, ou revolução informática e tecnológica. A chegada de telefones aos lares e depois de aparelhos de televisão, fez com que a “Era do Marketing” tomasse forma. Ao lado do rádio, os aparelhos eram os principais meios para a propagação da publicidade. Em outras palavras, os empresários agora tinham como divulgar seus produtos massivamente.

A partir daí, foi um pequeno passo para a chamada “Era do Cliente” que teve início por volta de 1970. Com os produtos precisando ser vendidos e a publicidade entrando mais em cena, a competição voltou a se acirrar e houve um retorno na questão da excelência do atendimento. O cliente, antes deixado de lado, agora era visto com outros olhos, precisava ser conquistado.

Na década de 90, o cliente dá mais um passo em direção ao seu trono de rei. Se iniciam os SACs e as empresas começam a trabalhar com programas de fidelidade e brindes. Pontos no cartão de crédito, vantagens para compradores assíduos, benefícios para os que sempre utilizam um serviço. Tudo para fazer o cliente se sentir especial e cuidado.

O chamado marketing de relacionamento veio à tona, nome dado justamente por essa característica de se relacionar com o cliente, ouvi-lo em vez de simplesmente tentar persuadi-lo para que comprasse seu produto.

Mas mesmo com todas essas mudanças, as empresas continuavam blindadas de certa forma, sabiam exatamente os recursos e as possibilidades dos clientes. As interações eram limitadas, não fugiam dos meios tradicionais, telefonemas, cartas, e etc. O cliente seguia submisso, preso.

O jogo volta a mudar a partir dos anos 2000. O computador pessoal passa a estar na maior parte das casas e a internet ganha um espaço jamais visto. Com isso, os call centers se tornam contact centers: diversas formas de contato, não só o telefone. É o início da chamada “Era da Experiência”.

O cliente passou a disseminar informações por conta própria, seja nos blogs ou nas primeiras redes sociais. Assim, opiniões que antes se limitavam à pequenos grupos, passaram a ganhar espaço. Fossem elogios ou reclamações, não havia participação alguma das empresas. O que hoje parece comum, entrar num site para checar avaliações de um restaurante ou comentários sobre uma loja de sapatos, foi absolutamente revolucionário nessa época.

É evidente que esse movimento deu ao cliente um maior poder de decisão e escolha, e a rápida evolução da internet só contribuiu com isso. Carinhas alegres ou tristes, estrelas douradas, e os polegares para cima e para baixo que falamos na introdução do livro são armas poderosíssimas. A possibilidade de se expressar e conversar diretamente com outros clientes fez com que as empresas ficassem contra a parede.

Mais do que estar contra a parede, as empresas ficaram expostas, e essa é uma situação sem volta. Optar por não participar desse jogo, bloqueando comentários ou fechando o canal de comunicação com os clientes é assinar uma sentença de morte. O que os resta então? Uma escolha inteligente é participar dessa conversa e colocar o cliente como principal protagonista.

Se, como já vimos, bloqueios em massa são capazes de matar empresas do dia para a noite, trabalhar contra isso e a favor dos que o podem fazer é essencial. A ideia da co-criação, usada pelas crianças do vídeo de 2013 “We are the future”, é justamente essa participação na conversa, caminho natural num cenário como o que vivemos. Estarmos unidos, pensarmos em conjunto para criar e servir de modo satisfatório.

A inclusão do cliente na equação, como fator principal, é a chave. Muitas empresas já perceberam isso, mas será que agem corretamente? Como será o futuro das empresas tendo em vista esse cliente? Haverá futuro? Tenhamos calma. Um passo de cada vez. Antes de tentar entender o futuro, vamos olhar para o cliente e analisar os detalhes que fazem ele ser o que é.